Há tempos leio artigos, ouço alguns argumentos, vejo o setor cultural tentando negociações e não consigo me encaixar em nenhum grupo sobre a questão da meia-entrada para estudantes, menores de 18 anos, pessoas na terceira idade e, agora, também professores. Essa é uma situação tão particular que, nesse molde, só existe no Brasil. Por que somente o setor cultural foi agraciado com tamanha disparidade?
Imagine você se o governo adotasse o mesmo critério em outros setores da economia? Se decretasse que 40% de cada empreendimento imobiliário construído fosse destinado aos estudantes e idosos por metade do preço? Ou que as escolas particulares fossem obrigadas a destinar 40% de suas vagas pela metade do valor das mensalidades cobradas? Ou ainda que cada médico tivesse que reservar essa mesma porcentagem em sua agenda diária para atender a uma parcela da população com 50% de desconto?
A única coisa que o governo consegue com uma medida arbitrária como essa é aumentar o preço dos ingressos para todos e, assim, restringir o acesso à cultura a uma elite que pode pagar 100, 200 ou 300 reais para ver um show ou assistir a uma peça de teatro. Se o objetivo é promover o amplo acesso da população à cultura, não faria mais sentido o governo oferecer seus espaços culturais gratuitamente e isentar o setor de seus impostos escorchantes? Todos sairiam ganhando: estudantes, menores de idade, idosos, professores, engraxates, pedreiros, balconistas, médicos, engenheiros, jornalistas, enfermeiros etc.
Nesse contexto, as leis de incentivo deveriam ser uma boa alternativa, mas novamente o que vemos é a distorção do mecanismo, que, ao invés de promover o acesso às mais diversas formas de manifestação cultural, delegam aos departamentos de marketing das grandes empresas o papel de definir o que deve ou não ser difundido como cultura.
O resultado é uma profusão de grandes eventos comerciais que geram visibilidade e retorno sem a necessidade do benefício, em detrimento da diversidade cultural, que permanece fora do circuito e da sociedade.
Por que ninguém levanta essa bandeira? Esse assunto é unanimidade? Não pode ser. Como alguém pode pensar em abrir um negócio, bancar sozinho um investimento de altíssimo risco, e o governo interferir no resultado dessa forma?
Ir ao teatro ou a um show não pode ser mais importante do que ir à escola, ao médico, ao dentista, ao supermercado etc. Precisamos provocar essa reflexão. Não estou falando de espetáculos que são montados com dinheiro de leis de incentivo. Estou falando de eventos que são inteiramente custeados por produtores culturais e que precisam se enquadrar nessa camisa de força injusta, arbitrária e que tem promovido danos gigantescos no setor, pois os preços dos ingressos acabam sofrendo o impacto desse benefício desigual.
Precisamos pensar diferente. Chega de arremedos. Bolsa disso e daquilo versus preços irreais. Quero um país decente, correto. Chega de caminhos tortuosos criados por políticos que, apesar de nunca conversarem com o setor cultural para entender nossas agruras, criam leis com objetivos eleitoreiros para que a gente padeça com as consequências. Para mim é simples: prefiro preço justo para todos ao invés do benefício fictício para poucos. Pensem nisso!
*Márcia Ribeiro, é Relações Públicas e empresária do setor de eventos, proprietária de Nó de Rosa Produções Culturai